Revoltado com a presença de Marcelo Gallardo no vestiário do River Plate mesmo suspenso no jogo que causou a eliminação do Grêmio na Libertadores, a direção tricolor foi ao Paraguaicobrar atitudes da Conmebol e ajuizar ação pela reversão dos pontos da partida, vencida por 2 a 1 pelos argentinos. São muitos os pontos reclamados pelo presidente Romildo Bolzan e que servem como argumentação.
Mas o clube gaúcho tem razão em recorrer à entidade máxima do futebol sul-americano em busca da reversão do resultado oficial? O GloboEsporte.com consultou especialistas em direito desportivo para falar sobre o assunto.
Além da comitiva em Assunção, os advogados do clube permaneceram a tarde toda trabalhando em cima da notícia infração para ser apresentada ao Tribunal Disciplinar. Apenas o presidente estava autorizado a falar com a imprensa sobre o caso depois da viagem – ele concederá entrevista coletiva na manhã desta quinta, na Arena.
Os pontos reclamados:
Além de ter entrado no vestiário, Gallardo foi flagrado em contato via rádio com o auxiliar Matías Biscaya, que ficou à beira do gramado na partida. A utilização deste meio de comunicação é proibida na competição. A entidade irá abrir novo procedimento para avaliar a conduta do treinador.
Por fim, o Grêmio reclamou veementemente do árbitro de vídeo Leodan González, que não teria alertado o juiz Andrés Cunha do toque de mão do atacante Borré no primeiro gol do River. O clube viu como justo o pênalti de Bressan, marcado somente com ajuda do VAR.
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Além de ir a vestiário, Gallardo usou comunicador em cabine da Arena — Foto: Reprodução
Confira abaixo a opinião de especialistas:
Marcelo Amoretty, especialista em direito desportivo
“Pela minha experiência, é muito difícil ter reversão do placar do jogo. Se fosse um atleta, ao invés do treinador, existe um artigo específico que trata de escalação irregular. O clube que se sentir ofendido faz a reclamação à Conmebol no prazo de 24 horas, o processo é instaurado e o clube pode ser condenado a perder o jogo por 3 a 0. Foi o que aconteceu com a Chapecoense, no ano passado, quando o Lanús obteve a punição do time brasileiro.
No caso de um treinador, não existe artigo específico. O treinador suspenso não pode participar do jogo, mas não diz que o clube pode perder os pontos. Possivelmente, pode o clube ser multado, ou o treinador ter a suspensão prorrogada. Anular jogo e reverter derrota é praticamente improvável.
O VAR só é utilizado se o árbitro ou um dos assistentes de campo pedirem. Eles têm que ter uma dúvida. No momento que não pedem, é por dois motivos: ou não viram o lance ou, se viram, entenderam toque não intencional.”
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Matias Biscay, auxiliar de Marcelo Gallardo no River Plate — Foto: Wesley Santos / Agência PressDigital
Eduardo Carlezzo, especialista em direito desportivo internacional
“Sou daqueles que entendem que as decisões tomadas pelo árbitro dentro do campo, ainda que manifestamente equivocadas, não deveriam ser passíveis de revisão. Porém, a partir do momento que a Conmebol possibilitou a revisão do cartão (vermelho) do Dedé, do Cruzeiro, contra o Boca, abriu essa brecha, esse precedente para que todos os clubes que se sentirem prejudicados possam reclamar aos tribunais.
Não há dúvida de que o Marcelo Gallardo será objeto de um novo procedimento disciplinar por não cumprir a sanção. Fatalmente vai ser punido, e espero que seja uma suspensão grande, de meses, educativa. Esse desrespeito ao protocolo confesso que há tempo não via.
O que interessa ao Grêmio é a sanção ao clube. Há argumentos e fundamentos jurídicos para buscar uma sanção ao River. Eventualmente, pode ser a perda dos pontos, e o Grêmio declarado vencedor por 3 a 0. É preciso mostrar que houve uma responsabilidade do clube nessas atitudes do Gallardo. Descer ao vestiário quebrou a suspensão, não dá para dizer que foi o clube.
Mas, a partir do momento que ele fala pelo rádio orientações ao time, claramente foi orquestrado. No mínimo, conhecimento e aceitação do departamento de futebol e até mesmo do presidente. Esse fato que envolve mais pessoas é gravíssimo e justifica, sim, uma medida extremamente pesada da Conmebol contra o River Plate. Uma das medidas é a perda dos pontos.
Porém, a realidade é que é muito difícil que a Conmebol vá aceitar esse pleito. O River vem sendo o clube mais beneficiado pela Conmebol nos últimos anos. Somente em 2018, usou dois jogadores irregulares, mas os adversários perderam os prazos para impugnação.”
O que dizem os regulamentos
- Regulamento da Libertadores
Artigo 115
Ao término do jogo, haverá coletiva de imprensa dos dois times com a maior brevidade possível em relação ao final da partida, que obrigatoriamente contará com a presença do treinador da equipe e um jogador que disputou a partida (que tenha jogado). A ordem das coletivas de imprensa, normalmente será a seguinte:
1º time: time visitante
2º time: time local
§1º – Os jogadores e oficiais expulsos durante a partida ou suspensos, não poderão participar da coletiva de imprensa. No caso do treinador ter sido expulso ou estar suspenso, deverá comparecer à coletiva de imprensa o assistente técnico.
§2º – O descumprimento do presente artigo constitui infração disciplinar encontrando-se facultados os órgãos disciplinares da CONMEBOL a impor as sanções que em conformidade com o Regulamento Disciplinar da CONMEBOL possam corresponder.
Artigo 116
Não é permitida a utilização de nenhum equipamento e/ou sistema de comunicação entre jogadores e/ou comissão técnica durante o jogo.
- Regulamento Disciplinar da Conmebol
Artigo 19 – Determinação do resultado de uma partida por responsabilidade ou negligência de uma das equipes
1. Sem prejuízo de outras sanções que possam ser impostas, qualquer equipe por cuja responsabilidade se determine o resultado de uma partida, será considerada como perdedora desse jogo por 3-0. Se o resultado real for menos favorável para o clube ou associação responsável, esse resultado será mantido.
2. Quando as partidas são disputadas de acordo com o sistema de copa (eliminatórias), os gols em campo contrário concedidos na aplicação do parágrafo 1 deste artigo não contarão em dobro.
3. No caso de escalação indevida de um jogador será aplicado o disposto nos parágrafos 1 e 2 do presente artigo unicamente se a equipe contrária interpuser uma reclamação oficial no prazo de vinte e quatro (24) horas uma vez finalizado o jogo, salvo que aquela tenha sido produzida porque o jogador em questão descumpriu uma sanção disciplinar regulamentar, decisão ou ordem dos órgãos judiciais. Neste caso, a Unidade Disciplinar iniciará o procedimento de ofício.
Artigo 56 – Motivos para reclamar contra o resultado de uma partida
1. São motivos para reclamar contra o resultado de uma partida:
a) Escalação indevida.
b) Uma decisão de um oficial de jogo que tenha influenciado no resultado do jogo exclusivamente em supostos de corrupção arbitral.
c) Qualquer outro incidente grave, estabelecido pelo presente Regulamento, que tenha tido influência no resultado da partida.
Artigo 76 – Execução ordinária de suspensões
1. O diretor esportivo/técnico, qualquer membro do corpo técnico ou demais oficiais sancionados com a suspensão de suas funções, poderão presenciar partida(s) na(s) qual(is) esteja vigente sua suspensão unicamente das arquibancadas. Não poderá acessar o vestiário, túnel, banco de reservas ou área técnica antes nem durante a partida, nem poderá por nenhum meio comunicar-se com sua equipe.