
Os 5×1 no Santos, na Arena, coroa uma semana onde tudo deu certo para o Grêmio. Semana não. Ano. São dois títulos e a certeza de que esta equipe ficará para a história não apenas pelos títulos, mas também pela forma que encanta e muda a cultura de um clube que foi convencido de que também é possível jogar leve e solto.
São 3 anos e 4 títulos com uma mesma base e uma mesma ideia. Tempo que não fomenta a união e formação de grupo, mas também cria uma sinergia de jogo imensa entre os jogadores. Eles “sentem” e jogam, sem necessidade de intervenção. A reunião de caras com experiências distintas – Kannemann, Geromel, Grohe, Maicon e Arthur – dá a inteligência para o Grêmio resolver seus problemas dentro de campo e ter na figura de Renato a competitividade que vinha faltando. É o ápice de uma equipe, tanto na parte física quanto na tática.
A forma que o Grêmio joga ajuda nesse jogo de sinergia e sentimento. O modelo é simples e busca concentrar jogadores por dentro do campo, ter laterais sempre abertos e buscando as inversões de lado o tempo todo. Para isso funcionar, o time joga “se desmarcando” o tempo todo: quem entra no setor da bola ataca um espaço vazio e cria linhas para receber a bola. Geralmente por dentro, seguindo Luan, que gosta de ter a bola e conduzir, e para isso, sempre recua e procura o lugar vazio para receber. Na imagem é possível ver como André e Luan viram o corpo para Ramiro, e Maicon chega perto da jogada.
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Grêmio “se desmarcando” para receber (Foto: Leonardo Miranda)
O Grêmio é o time que procura estar sempre perto da bola, gosta e valoriza ela. E isso parte do entendimento dos jogadores. Se jogar com a bola é o jeito do time, logo todo mundo – não importa posição ou função – recua e procura ocupar um espaço longe do adversário, sempre com o corpo e o pé virados para receber.
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Grêmio novamente “se desmarcando” próximo a Arthur (Foto: Leonardo Miranda)
Esse jogo de concentrar gente por dentro permite e Arthur e Maicon serem articuladores de praticamente todo o time. Eles gostam de ficar de frente para o jogo, e se um se junta ao ataque, outro fica atrás da linha da bola para receber e articular. Na jogada abaixo, um exemplo: Maicon foi, Arthur ficou e recebeu a bola. Imediatamente, Cortez faz o movimento de apoio pelo lado. Isso parte de um entendimento natural e uma confiança que, se Cortez correr no espaço, vai receber na medida e, se cruzar, a bola vai ser aproveitada dentro da área. A confiança vem com o tempo, as vitórias e a prova de que aquela forma de jogo dá certo. Tanto para o time como para os jogadores.
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Cortez aberto, fazendo o movimento para receber de Arthur (Foto: Leonardo Miranda)
Esse movimento de atacar o espaço pelo lado é feito não apenas pelo lateral, mas também por Ramiro na direita. O Grêmio fica com a bola por dentro, gira o jogo e encontra profundidade nos lados. Veja que, no gol de Maicon, Ramiro faz o mesmo que Cortez: vê a bola com os dois articuladores e ataca um espaço com a confiança de que vai receber. Maicon tem um leque imenso de jogadas a escolher, e decide acertar um chutaço no gol de Vanderlei.
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Gol de Maicon e a movimentação de Ramiro (Foto: Leonardo Miranda)
Só com títulos se muda a cultura de um clube, e esse Grêmio vem conseguindo
O torcedor tem o desejo irrevogável de ver o time vencendo e ganhando, e a forma com a qual essa história é construída vai ditando o imaginário e a exigência da arquibancada. O Grêmio sempre foi o time de força, de “sujar o calção”, como Luxemburgo disse, em 2012. As conquistas invictas de Oswaldo Rolla na década de 30, os títulos de Carlos Froner e Luiz Felipe Scolari ajudaram a moldar a imagem de um time que privilegia a força física e o futebol direto.
O Grêmio de Renato vem mudando essa história porque entrega um futebol antagônico à história do clube que gera como produto títulos. A conquista tem um peso imenso no futebol. É ela que “valida” o que vem sendo feito. Depois da Copa do Brasil de 2001, o Grêmio passou por penúria financeira e caiu para a 2ª divisão, parindo um acesso e vendo Mano Menezes formar uma base fiel ao estilo do clube. Mas faltou o título que abraça, dá calma e valida as escolhas do treinador.
Não faltaram tentativas de atualização. Nos 8 jogos com Caio Júnior no comando, a comparação sob a pecha de “Barcelona dos pampas” por um estilo que valorize mais a bola, algo concatenado com o que estava sendo feito na Europa. Depois, a chegada de Luxemburgo e um time leve, que fez grande 2º turno no Brasileirão de 2012 num meio-campo em quadrado, formado por Souza, Fernando, Elano e Zé Roberto. Criadores de jogo, nenhum destruidor como Dinho. Tentativas que pararam na falta de paciência natural e os pedidos pelo resgate dos times cascudos.
Foi o fracasso da velha fórmula, emulada na figura de um ídolo, que ajudou a torcida a entender que era preciso, antes de tudo, uma mudança de postura. Felipão tentou a mesma fórmula copeira de 95. Mas não só o futebol mudou, como os jogadores também mudaram. Roger Machado, seu sucessor, pensou e fomentou um jogo que Renato aperfeiçoou entendendo a inteligência de seu grupo.
É por isso que este Grêmio é sim uma das melhores equipes da história do clube. Se é a melhor, só a saudade após o grupo se desfazer dirá.